domingo, 21 de outubro de 2012

Sentimentos Diversos

Meu nome é Kazumi e faço parte de um mundo sonhador e misterioso. Eu valorizo os aspectos simples e verdadeiros da vida, como as lembranças. Elas, com toda a sua vaidade, apresentam para o espelho do presente a origem dos meus valores e meus defeitos. Partindo desse princípio, é inevitável bloquear as recordações de uma época cuja dor se confundiu com a vontade de sorrir. É um sentimento abstrato e de díficil compreensão, porém necessário. Eu sou incapaz de expressar meus sentimentos pela fala, pois a comunicação é um dom permeável aos que alimentam um espírito espontâneo; logo, eu necessito do papel para salvar as minhas ideias e o meu ego da opressão do silêncio. Caros leitores, não se assustem com as minhas fraquezas, afinal elas são uma condição peculiar do coração, uma categoria, uma dimensão que só se liberta na solidão.
    Há dois anos, eu trabalhava em uma empresa especializada em atendimento ao cliente e deixava o ambiente de trabalho entre meia-noite e uma hora da manhã. Eu detestava caminhar pela cidade naquele horário, mas era o único percurso até a minha casa. O caminho era obscuro, sujo, e cheio de pessoas jogadas ao chão se misturando aos restos de comida e vermes. Era impossível diferenciar homens de animais. Certo dia, passando pela mesma via caótica, me deparo com uma família padrão: pai, mãe e dois filhos; observei as crianças chorando e os pais desesperados.
    Eu me aproximei daquelas pessoas com a intenção de ajudar, pois era inevitável não notar no sofrimento delas. Durante o diálogo que eu iniciei, descobri fatos deploráveis. As crianças não se alimentavam há três dias, pois os pais eram catadores de lixo, mas ultimamente não estavam conseguindo dinheiro suficiente para se alimentarem. Eu me emocionei com a fala dos pais e, como eu tinha alguns biscoitos na mochila, dei as crianças para comerem. Aquele senhor ficou tão comovido com a minha atitude que não teve forças para demonstrar gratidão. Eu não me importei e sentei junto a eles o resto da noite. Pela manhã, me despedi e continuei trilhando meu caminho. Contudo, meus pensamentos ainda estavam parados no semblante de tristeza daquelas pessoas.
     Esse fato aconteceu em uma época em que a principal doutrina era o consumismo; era o período natalino. Talvez não haja momento mais hipócrita, com mesas fartas, orações orientadas pela pena, sentimentos altruístas e descartáveis do que esse. A opinião expressa se deve a seguinte questão: as pessoas se reunem, organizam-se em círculos para fazer seus pedidos e agradecimentos, cumprimentam-se, trocam presentes, comem, bebem, pregam a paz e a solidariedade. Porém, essa harmonia só acontece naquele dia. O mundo não funciona somente no Natal. As crianças necessitam de carinho e atenção a todo instante e os necessitados passam fome e sentem frio todos os dias. Eu queria acordar, olhar o mundo e poder ver a solidariedade como sendo a maior fonte de riquezas do homem.
     Somos pessoas impotêntes e paralíticas diante das adversidades que não danificam a nossa realidade e construimos um mundo restrito pelo interesse apenas para alimentar determinados status. Considero que os bens mais importantes são as pessoas que estão aqui e agora, pois a amizade é um amor que nunca morre. O materialismo cegou a humanidade. Talvez se a sociedade não fosse tão egoísta, egocêntrica e materialista, as mazelas do mundo não existissem. Tenho um passado marcado por falhas, angústia e dor, pois sempre caminhei errado e meu destino é incerto. Ao passar e ver aquela família, não pude ignora-los. Dessa forma, naquele momento, eu tentei ser diferente e assumi a responsabilidade de dar aquelas pessoas um pouco de atenção. Eu não pretendia ver o que eu vi, mas aconteceu. Essa era a minha realidade e eu não fugi, pois isso não atenuaria minha dor.

sábado, 29 de setembro de 2012

Imaginando o que é amar.

     Escrever ou falar sobre o amor é algo difícil pra mim. Afinal, eu nunca senti e tão pouco conheci. Meu desejo é acordar, refletir sobre a realidade e nela incluir pensamentos afetivos em relação a alguém. Eu sinto amor pelas leis naturais: pai, mãe, família. Amo zelar pela dedicação, leitura e me apaixonar pelas artes. Sinto benevolência pela compaixão, sinceridade, amizade, ou seja, sentimentos concretos e isentos de qualquer interesse. Mas, nunca encontro o amor por alguém.
     Talvez eu seja o erro. Sou simples, realista e fechado. Por isso, eu resolvi construir uma voz dentro de mim e assim, forçar-me a praticar ações peculiares a cada situação. É uma espécie de idiossincrasia da solidão. Mas, a timidez é uma circunstância pela qual eu ainda não consigo definir a minha atuação. Nesse aspecto, sou um agente do medo. É inegável a observação da permeabilidade dos meus olhos.
     Agora eu estou aqui deitado na minha cama, escrevendo essas palavras e imaginando uma definição para o amor, mesmo não te-lo sentido. Porém, o único axioma que alcancei foi o de que não deve haver amor maior do que a amor próprio.Em quais oportunidades eu devo dissimular ou manifestar minhas emoções? Essa é uma dúvida angustiante. Talvez o tempo me mostre a resposta. É hora de ocupar a cabeça e distrair os olhos.
     Imaginei uma teoria para o amor. Lembrei das palavras do Padre Antônio Vieira. Ele disse: "o amor fino não busca causa nem fruto. Se amo, porque me amam, tem o amor causa; se amo, para que me amem, tem fruto: e amor fino não há de ter porquê nem para quê. Se amo, porque me amam, é obrigação, faço o que devo: se amo, para que me amem, é negociação, busco o que desejo. Pois como há de amar o amor para ser fino? Amo porque amo, e amo para amar. Quem ama porque o amam é agradecido. quem ama, para que o amem, é interesseiro: quem ama, não porque o amam, nem para que o amem, só esse é fino". Faço das palavras de Vieira as minhas.
     É tempo de deixar correr boas lembranças pelo coração, acreditar nas pessoas e nas suas emoções. Vou seguir as minhas convicções me apropriando de pensamentos úteis e com isso, transformar minhas dúvidas em certezas. Quero viver o amor na sua mais alta potência. Aproveitar as suas qualidades, tristezas e até mesmo o seu ciúmes. Abrir os olhos, os braços e me lançar ao mundo. Conquistar o sentimento expresso é uma questão de oportunidade.  

domingo, 23 de setembro de 2012

Gritos dos inocentes

"Não, não é conto. Sou apenas um sujeito que escuta algumas vezes, que outras não escuta, e vai passando." ( C.D.A )
Naquele dia escutei.
Certamente porque era um amigo quem falava e ,
É doce ouvir os amigos , ainda mais quando não falam
Porque amigo tem o dom de se fazer compreender
Mesmo sem sinais
Sem palavras , sem olhos , sem nada .
Amigo tem o poder de se desfazer mortal
Em corações alheios perdura o canto da alegria infame .
Ontem retornei a ouvir , a música da emoção
Ela me chamava a partir para um mundo sem rumo
Sem vésperas inúteis .
Na esquina desse mundo se escuta o solene madrigal das damas
Essa canção acolhe o peito e abrilhanta as manhãs fumegantes
Até que o mundo padece...
Os suspiros desesperados por um retorno
Indagamos explicações , suplicamos soluções.
Gritamos nossos irmãos
Com a justiça das vozes se cria um novo lugar
Uma nova esperança, um novo mundo.

Sombras do passado

Pensei que isso fosse me matar , mas não pode .
Morri há meses e ainda carrego as lembranças
Preciso conhecer o poder do perdão
Mas não o que vem de fora e sim aquele de dentro
Porque é ele que tem o poder de curar
Sem deixar cicatrizes...
Viver é um sacríficio .
Me sinto como um fantasma sem casa
Sem rumo , sem afeição .
Lá fora cai a chuva e aqui dentro escrevo no escuro
Porque a luz que ilumina meu caminho está se acabando
E agora sinto só a aspereza do passado ,
O poder da ilusão
Não sei o que esperar
Muito menos o que procurar
Ou será que as respostas já chegaram
E as drogas não me deixaram as observar ?
Todas as noites eu perco o coração
Pela manhã ele se reconstroi , se inflama .
A esperança renasce...
O que vem depois só o tempo dirá
E eu estou ancioso para escutar

 

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

A necessidade de falar.

Não sei o que sentir e tão pouco o que pensar. Porém, na minha atualidade, eu só preciso falar. Expelir palavras que estabeleçam meus desejos e ajudem a criar o meu universo. O maior predador do homem não é sua ignorância, excesso de moralidade ou egoísmo, mas o tempo. Devido a isso, o meu maior anseio é transforma-lo em uma espécie de amor correspondido.
Esse tempo, com a sua infinidade, se transforma em solidão que, por sua vez, assume a minha forma racionalista, finita e cheia de dúvidas. O que eu penso? O que eu sinto? Como me Determino?. Perguntas relevantes que assimilam desejos e configuram um conjunto de respostas que, muitas das vezes, deixam a desejar.
Mesmo com essa quebra de expectativa não posso ser hipócrita, ou inocente, e assumir juízos de valores irrisórios ou banais. Isso porque durante o meu processo de formação o tempo, que agora é meu melhor amigo, irá trazer-me pessoas com os mais exóticos sentimentos, obstáculos dos níveis mais diversos e assim, eu preciso assumir a minha missão: acreditar nas minhas intuições, forja-las em conceitos e terminar na formação de minhas ideias.
Por fim, preciso ter paciência. Meus passos parecem estáticos, ou seja, dão a impressão de não me levar a lugar algum. Dessa forma, o espírito de angustia vai tomando conta do meu coração. Chega de falar por hoje. A sensibilidade vai se aproximando dos meus olhos e, a respeito disso, eu não posso perder o controle. Enfim, tenho crença suficiente objetiva e subjetiva para acreditar e continuar caminhando mesmo que sem garantias.

sexta-feira, 7 de setembro de 2012

Reinventado a realidade

Leiam ao som de uma linda música.

    Fora de casa cercado por serras, matas e construções históricas observadas a distância, ínfimas aos olhos. Estou entre amigos, com muito sol e água a jorrar. Nessa paisagem vamos cantando e tocando músicas que remetem ao coração. Se nesse mundo de guerras e ditaduras psicológicas ainda exista paz, eu estou vivendo a minha. É hora de dar olá para o pôr do sol e logo em seguida admirar as estrelas, cada uma com sua história, cada uma com seu brilho.
   Chega a noite escura, fria e cheia de surpresas. Assim, acendemos a fogueira e começamos a contar histórias de nossas infâncias. Materializar o passado em palavras, lembranças e sorrisos é como reinventar a nossa realidade. Dessa forma, eu redescobri a vida. Viver é muito bom e como somos prisioneiros do tempo, temos que aproveitar o momento.  
   O fogo está se apagando. Escuto o som dos animais e sinto o vendo levando as cinzas. Logo depois, entrei para minha barraca, peguei o meu caderno, minha caneta e comecei a escrever essas palavras. Elas são simples e singelas, assim como foi meu dia. Estou com sono. Vou dormir pensando em minhas doutrinas.
   Ao acordar no dia seguinte, infelizmente percebi que tudo era apenas parte da minha imaginação. Nunca tive pensamentos tão reais. Esqueci o quanto é agradável sonhar. Bom, está na hora de voltar a carregar minha mochila, meus livros, pensamentos e enfrentar a minha realidade. Voltei a enxergar as hipocrisias, falsidades e sentimentalismos artificiais. Contudo, vou criando minhas barreiras e me distanciando desses valores imorais tão inerentes a sociedade atual.
   Continuo fora de casa, mas agora os meus passos se alternam entre perdas e ganhos, silêncio e atividade, nascimento e morte. Estou entre edifícios, cercado por poeiras e sons que remetem ao desespero. Assim, vou deixando meus rastros que anseiam por liberdade para irem em busca da imortalidade.

segunda-feira, 3 de setembro de 2012

Transformações

 

     Hoje meu dia começou estranho; quando acordei deparei-me com o passado. Ele chegou de súbito, sem dar satisfações e começou a me questionar. Comecei e dividir minha vida em épocas. Antes eu vivia a época em que as vontades do mundo me tornaram submisso e alienado, devido aos meus olhos opacos e cheio de dúvidas. Anos mais tarde fui apresentado aos livros, a filosofia e a matemática, essa foi a época das descobertas. 

     Com isso, fui moldando minhas opiniões, meus costumes e meus desejos. Descobri que vivemos em um mundo de mentiras, no qual a tirania e a opressão – mais conhecida como capitalismo – tem em suas mãos o comando geral das regiões em que atua. Esse comando proeminente provém das caricaturas de cidadãos que votam como se estivessem brincando de cabra cega. Essa foi a época das descobertas.

     Hoje vivo a época das certezas, pois consolidei o meu gosto pelos números, aprendo incessantemente com a filosofia e transformei meus livros em irmãos. Assim, o passado foi embora com um ar de alívio afinal, sua função era transformar os meus olhos em lentes translúcidas para que eu possa enxergar além da história e transformar as minhas dúvidas em dogmas e ideologias.

domingo, 2 de setembro de 2012

O sonho de uma flauta

“ baseado em trechos de Mário Quintana e Herman Hess, surge a canção: O sonho de uma flauta “

O Sonho de uma flauta – Herman Hess

- Toma - disse meu pai, e entregou-me uma pequena flauta de osso - leva isso e não esqueças teu velho pai, quando alegrares com tua música as pessoas nas terras distantes. Já é tempo de agora veres o mundo e aprenderes alguma coisa. Mandei fazer a flauta para ti, porque não sabes nenhum outro ofício e só gostas de cantar. Mas pensa também em só tocar sempre canções bonitas e agradáveis, senão seria pena pelo dom que Deus te concedeu.

Meu querido pai entendia pouco de música, não era um sábio; pensava que eu tinha apenas de soprar a linda flautinha e tudo estaria bem. Eu não queria decepcioná-lo, por isso agradeci, botei a flauta no bolso e me despedi.

Nosso vale era conhecido até o grande moinho; depois então começava o mundo, e ele me agradou bastante. Uma abelha cansada do vôo pousou na minha manga, e eu a levei comigo, afim de que no meu primeiro descanso tivesse um mensageiro para mandar de volta, como um cumprimento à minha terra.

Bosques e prados acompanhavam meu caminho, e o rio corria junto, vigorosamente; eu vi, o mundo deferia pouco da minha terra. As árvores e flores, as espigas de trigo e as moitas de avelã falavam comigo, cantei com elas suas canções e elas me compreendiam, exatamente como lá em casa; com isso minha abelha também despertou, subiu devagar até meus ombros, voou e tornou a cruzar duas vezes comigo, com seu zumbido profundo e doce, e então voltou para minha terra.

Aí apareceu diante do bosque uma mocinha, que carregava uma cesta no braço e um largo e sombrio chapéu de palha na cabeça loura.

- Bom dia - disse-lhe eu - aonde vais?

- Devo levar a comida aos ceifeiros - disse ela, e caminhou ao meu lado. - E para onde quereres ir ainda hoje?

- Vou para o mundo, meu pai me mandou. Ele acha que devo tocar flauta para as pessoas, mas isso ainda não sei direito, preciso primeiro aprender.

- Bem, bem. E que sabes então direito? Alguma coisa é preciso saber.

- Nada de especial. Sei cantar canções.

- Que canções?

- Canções de todo o tipo, sabes, para a manhã e para a tarde e para todas as árvores e bichos e flores. Agora, por exemplo, eu poderia cantar uma bonita canção de uma mocinha que vem saindo do bosque e traz comida para os ceifeiros.

- Podes fazer isso? Então canta um pouco!

- Sim, mas como te chamas mesmo?

- Brigite.

Então cantei a canção da linda Brigite com o chapéu de palha, o que ela traz na cesta, e como as flores olham para ela, e a trepadeira azul da grade do jardim sente saudades dela, e tudo o que se podia dizer. Ela prestou atenção seriamente e disse que estava bom. E quando lhe contei que estava com fome, ela levantou a tampa de sua cesta e apanhou para mim um pedaço de pão. Como mordi um pedaço e continuei firmemente a andar, ela disse:

- Não se deve comer andando. Uma coisa depois da outra.

Nos sentamos na grama e eu comi meu pão e ela cruzou as mãos morenas em volta da perna e ficou me olhando.

- Queres cantar ainda coisa para mim? - perguntou então, quando terminei.

- Quero, sim. Que deve ser?

- Sobre uma moça que está triste porque o amado partiu.

- Não, isso não posso. Não sei como é isso, e a gente também não deve ficar tão triste. Eu só devo cantar canções gentis e alegres, disse meu pai. Vou cantar para ti sobre o cuco ou a borboleta.

- E do amor não sabes nada? - perguntou ela, então.

- Do amor? Ora, claro, isso é o mais bonito de tudo.

Imediatamente comecei a cantar sobre o raio de sol que ama as papoulas vermelhas e como ele brinca com elas e fica cheio de alegria. E sobre a fêmea do tentilhão, quando espera por ele e quando ele vem, ela voa para longe e parece amedrontada. E continuei a cantar sobre a menina dos olhos castanhos e sobre o rapaz que chega, canta e por isso recebe um pão de presente; mas agora ele não quer mais pão, ele quer um beijo da donzela e quer olhar os seus olhos castanhos, e continua a cantar tanto tempo e não termina, até que ela começa a rir e lhe fecha a boca com seus lábios.

Aí Brigite debruçou-se e fechou-me a boca com os lábios e fechou os olhos e tornou a abri-los e eu olhei as estrelas castanho-douradas bem perto, eu próprio refletido ali dentro e um par de brancas flores do prado também.

- O mundo é muito bonito - disse eu - meu pai tinha razão. Mas agora quero te ajudar a carregar isso para que cheguemos até tua gente.

Tomei-lhe a cesta e continuamos a andar, seu passo combinava com o meu e sua alegria com a minha, e o bosque suave e fresco falava da montanha em volta; eu nunca havia caminhado com um prazer tão grande. Durante longo tempo cantei alegremente, até que tive de parar de tanta satisfação; eram coisas demais que rumorejavam e contavam-se sobre o vale e a montanha e a grama e a folhagem e o rio e a floresta.

Aí pensei: se pudesse compreender e cantar ao mesmo tempo essas mil canções do mundo, das gramas e flores e gente e nuvens e tudo, da floresta velha e do pinheiral e também de todos os bichos, e além disso ainda canções dos mares longínquos e montanhas, e as das estrelas e luas, e se tudo isso pudesse ressoar e cantar em mim ao mesmo tempo, então eu seria o querido Deus, e cada nova canção deveria ficar no céu como uma estrela.

Mas enquanto eu assim pensava, estava silencioso e maravilhado, porque aquilo antes nunca me ocorrera, Brigite parou e segurou a alça da cesta.

- Agora devo ir lá em cima - disse ela - lá no campo está nossa gente. E tu, para onde vais? Vens comigo?

- Não, ir contigo não posso. Preciso ir pelo mundo. Obrigado pelo pão, Brigite, e pelo beijo; vou pensar em ti.

Ela segurou a cesta de comida, e sobre a cesta seus olhos novamente se inclinaram para mim em sombras castanhas, e seus lábios prenderam-se aos meus e seu beijo foi tão bom e carinhoso, que quase fiquei triste de tanto prazer. Então gritei rápido:

- Vai com Deus - e marchei apressadamente pela estrada acima.

A moça subiu devagar a montanha, e sob as folhas de faia pendurada na orla do bosque, parou e olhou na minha direção, e quando lhe acenei com o chapéu, ela tornou a balançar a cabeça e desapareceu silenciosamente, como uma miragem, para dentro da sombra do bosque.

Eu, porém, continuei tranqüilamente meu caminho, e estava imerso em meus pensamentos, quando a estrada dobrou num curva.

Lá havia um moinho e, perto, um barco na água; dentro estava sentado um homem sozinho e parecia apenas esperar por mim, pois quando tirei o chapéu e entrei no barco, este, em seguida, começou a andar e deslizou rio abaixo. Eu estava sentado no meio do barco, e o homem atrás, no leme, e quando lhe perguntei para onde íamos, ele levantou os olhos cinzentos e encarou-me com um olhar velado.

- Para onde quiseres - disse, com uma voz abafada. - Rio abaixo e para o mar, ou para as grandes cidades, podes escolher. Tudo me pertence.

- Tudo te pertence? Então és o rei?

- Talvez - disse ele. - E, ao que me parece, tu és um poeta, não? Então canta-me uma canção de viagem!

Fiz um esforço, estava com medo do homem grisalho e sério, e nosso barco deslizava rápido e silencioso pelo rio. Cantei sobre o rio, que carrega o barco e reflete o Sol e rumoreja mais forte nas margens dos rochedos e completa alegremente seu passeio.

O rosto do homem continuou impassível, e quando prestei atenção, ele balançava a cabeça como um sonhador. Então, para meu espanto, ele próprio começou a cantar, e também cantava sobre o rio, e sobre a viagem do rio através dos vales, e sua canção era mais bela e poderosa que a minha, mas tudo soava diferente.

O rio, tal como ele cantava, vinha como um destruidor vacilante montanha abaixo, escuro e selvagem; furioso, ele se sentia dominado pelos moinhos, coberto pelas pontes, detestava cada navio que precisava carregar, e, em suas ondas e nas longas e verdes plantas aquáticas, rindo, balançava os corpos brancos dos afogados.

Isso tudo não me agradou, e entretanto era tão belo e cheio de um acento invisível, que fiquei completamente desorientado e angustiado e me calei. Se era certo o que esse velho, sensível e inteligente cantor, cantou com sua voz velada, então todas as minhas cantigas não passavam de tolices e brincadeiras bobas de criança. Então o mundo, por causa delas, não era bom e luminoso como o coração de Deus, e sim escuro e triste, mau e sombrio, e quando os bosques murmuravam, não era de alegria, e sim de martírio.

Seguimos adiante, e as sombras foram longas, e de cada vez que comecei a cantar, meu canto sova menos claro, e minha voz tornava-se mais baixa, e de cada vez o cantor desconhecido respondia com uma canção que tornava o mundo ainda mais enigmático e penoso, e me tornava ainda mais tímido e triste.

Minha alma doía e eu me arrependia de não ter ficado em terra, perto das flores ou da linda Brigite, e para sentir-me seguro no crepúsculo que crescia, recomecei a cantar e cantei na luz vermelha da tarde a canção de Brigite e de seu beijo.

Aí o crepúsculo começou, e eu emudeci, e o homem no leme cantou, e ele também cantava sobre o amor e a alegria do amor, sobre os lábios vermelhos e úmidos, e era lindo o que ele cantava, cheio de dor, sobre o rio escurecido, mas em sua canção também o amor se tornara sombrio e temível, e um segredo mortal, no qual os homens aflitos e feridos tocavam com seu desejo e sua saudade, e com o qual se martirizavam e se matavam uns aos outros.

Escutei e fiquei tão cansado e aflito, como se estivesse viajando desde muito tempo e houvesse passado por grande miséria e desgraça. Vinda do estranho, sentia cair sobre mim uma torrente silenciosa e fria de tristeza e receio, a penetrar no meu coração.

- Pois bem, a vida não é o que há de mais elevado e mais belo - gritei afinal amargamente - e sim a morte. Então te peço, rei triste, canta-me uma canção da morte!

O homem do leme cantou somente sobre a morte, e cantou melhor do que eu jamais ouvira cantar. Mas a morte também não era o que havia de mais elevado e mais belo, nela também não se encontrava consolo. A morte era vida e a vida era morte, e elas estavam entrelaçadas numa perpétua e furiosa luta de amor, e isso era a última coisa e o sentido do mundo, e dali vinha um clarão, que parecia querer valorizar toda a miséria, e de outro lado vinha uma sombra que perturbava toda a alegria e beleza e as envolvia na escuridão. Mas para além da escuridão, a alegria ardia mais íntima e bela, e o amor queimava mais profundamente nessa noite.

Escutei e fiquei bem quieto, não tinha mais nenhuma vontade dentro de mim além da vontade do estranho. Seu olhar repousou sobre mim, tranqüilo e com uma certa bondade triste, e seus olhos cinzentos estavam cheios da dor e da beleza do mundo. Ele me sorriu, e então achei nele um coração, e pedi na minha dor:

- Ah, vamos voltar! Sinto medo aqui na noite e queria retornar para onde posso encontrar Brigite, ou para a casa de meu pai.

O homem levantou-se e espiou a noite, e sua lanterna iluminou claramente seu rosto magro e firma.

- Para trás não há caminho - disse sério e amável. - A gente precisa ir sempre para a frente, quando quer penetrar no mundo. E da garota dos olhos castanhos já tiveste o melhor e o mais belo, e quanto mais longe estiveres dela, melhor e mais lindo isso vai se tornar. Ainda assim, segue sempre para onde quiseres, vou te ceder meu lugar no leme!

Eu estava triste demais, e, entretanto, vi que ele tinha razão. Cheio de saudade pensei em Brigite e na minha terra e em tudo que me fora próximo e luminoso e que pertencera, e que eu agora havia perdido. Mas queria tomar o lugar do desconhecido e dirigir o leme. Assim devia ser.

Por isso levantei-me em silêncio e fui andando pelo barco até o lugar do leme, e o homem veio em silêncio ao meu encontro, e quando já estávamos perto um do outro, olhou-me firmemente no rosto e entregou-me sua lanterna.

Entretanto, quando me sentei ao leme com a lanterna do meu lado, estava sozinho no barco; percebi isso com profunda estranheza, o homem desaparecera, e, contudo, eu não estava amedrontado, já pressentira isso. Pareceu-me que o lindo dia da caminhada e Brigite e meu pai e minha terra tinham sido apenas um sonho, e que eu era velho e aflito, e que desde sempre e sempre viajava sobre esse rio noturno.

Compreendi que não devia chamar pelo homem e a percepção da verdade atingiu-me como a geada.

Para certificar-me do que imaginava, debrucei-me sobre a água e ergui a lanterna, e do escuro espelho de água um rosto duro e sério me olhou com olhos cinzentos, um rosto velho, sábio, e vi que aquele era eu.

E como nenhum caminho voltava atrás, continuei seguindo sobre a água escura dentro da noite.

Minha loucura é minha arte.


‎” Aprendi a conviver com minha loucura. Ela traz diversão e conselhos, pura idolatria. Sou inspirado pelo medo unido ao efêmero da existência. Este alimenta a hipocrisia social que nega aqueles cuja razão foi perdida. Nietzsche se eternizou por ser excêntrico e o seu caminho, por vários, foi seguido. A minha normalidade é minha loucura que, por sua vez, se tornou na minha romancista arte. Dessa forma, idolatro a fuga da realidade e repudio o desejo de posse, pois ele impede o homem de ser livre e a honestidade fica em segundo plano. Assim, eu criei o meu próprio  complexo de loucuras mentiras. “

Consumindo o Tempo.













     Hoje eu andei por um lugar incomum, vulgar e depressivo. Nessa atmosfera, poluída pelas articulações corruptas da alienação, o consumo do tempo causou-me um sentimento abstrato a respeito das condições humanas. Viver as vezes cansa, pois é difícil caminhar sobre a podridão humana e paralelo a isso observar o contraste social, entre classes. O ser humano me decepciona e vendo essas imagens, degenerativas, só aumenta o meu desgosto. Eu queria conseguir aceitar as coisas como elas são, mas eu tenho um grave defeito, ser crítico até o limite. Contudo, esse meu espírito livre de doutrinas é o que me mantem longe dessa alienação desumana. Vivo um paradoxo e dele pretendo extrair ideias concretas sobre como me orientar em meio a humanidade de tal forma que eu não crie um desespero absoluto a respeito da realidade.

Kafka quebra o meu silêncio



















Eu vou viver no meu interior , pois aqui eu sei quem sou e gosto de quem eu sou . Nesse ambiente , Vou me armar com livros e criar uma aliança com Kafka e nessa união pretendemos vislumbrar a Metamorfose de acordar de um sono intranquilo e ver que , ao nosso redor , não vivemos em um lugar longe da moralidade e preconceito .
  A metafísica de um lugar onde a sensação de liberdade não se confunda com a luta pela sobrevivência é sobreposta pela energia delgada do silêncio , o meu silêncio . Contudo , meu amigo Kafka , quebra o padrão e me consola dizendo que a nossa consciência necessita de grandes ferimentos , pois , dessa forma , a necessidade do pensamento se torna evidente e , assim , é inevitável fugir das mudanças necessárias . O impacto dessas palavras foram incalculáveis . Fechei o livro e adormeci .
  Poucos instantes depois escuto uma voz . – Quem é você ? – perguntei . Ela não me respondeu e apenas disse pra eu deixar de lutar contra sensações abstratas que não possuem gestos aplicados ao mundo atual . Em seguida ela se foi , assim como a penumbra que se formava ao fundo . Logo em seguida o sol veio sorrir para mim e anunciar que a noite se esvai . Levantei , fui beber água , voltei e quando fui tentar retomar a conversa da noite anterior , percebi que aquela voz era a metamorfose da minha inconsciência e estava ali predestinada a mostrar-me que o meu silêncio é a união dos meus medos e fracassos . Assim , eu vi que sou apenas um pequeno aprendiz que vive cada dia por um triz nesse mundo. 
  Com tudo isso , aprendi que a minha maior loucura é acordar , todos os dias , e imaginar que o mundo é um lugar tranquilo e que tentar entender a abstração da moral e do desrespeito é a pior forma de atenuar a minha dor causada pela descrença no ser humano . Hoje , eu só quero dar voz ao meu sossego , caminhar sobre certezas , trocar olhares com o mundo e confirmar meus novos sonhos e intenções e , por fim , descansar com a certeza de dever cumprido . 
E assim Kafka quebrou o meu silêncio .


O Apanhador nos Campos de Centeio


      Lá fora chove e aqui dentro eu pego meu chá , meu livro e sento na minha poltrona . Comecei a revirar as páginas do passado e associado a isso vem as lembranças daquele tempo furtivo em que eu era apenas mais um alienado disfarçado de menino . É difícil explicar aquela época , pois , a jovialidade , aspereza e ambição de uma mente perturbada me fazia tomar ações abruptas e as consequências eram as ultimas coisas a se pensar . Tudo parecia sem fim até o dia em que chá se transformou em cerveja e o cigarro em drogas . 
      O mundo começou a ruir e me sentia dentro de uma espiral e no fim só existia a escuridão. Sucumbi a poluição do pensamento . Quando acordei sentia gotas de chuva , mas que pareciam flechas direcionadas ao meu coração . Sem rumo e nem lugar continuei caminhando em busca de uma luz até que encontrei algo que me despertou o interesse , um livro. Ele estava jogado na lixeira de um edifício e eu ficava me perguntando o porque ele estaria ali sozinho assim como eu .
      Nunca vou esquecer o nome do livro , O Apanhador nos Campos de Centeio, de Jd. Salinger . Sentado em baixo de uma escada que dava para uma praça , comecei a ler a obra e aquilo me transformou . O livro falava de drogas , prostitutas e sentimentos , poesia e práticas cínicas dos adultos . Foi o primeiro livro que eu li e ele transformou-me e aguçou a minha curiosidade pela leitura . 
      Em tempos de crise e escuridão ele foi minha luz que iluminou meu caminho e me mostrou que o ser humano pode falhar , mas independente da falha sempre há correção e basta ter persistência , vontade de vencer e principalmente aprender com os erros . Bom , a cerveja voltou a ser chá , o cigarro virou chocolate e a chuva agora é o simbolo da minha limpeza espiritual . Vou parando por aqui porque preciso terminar de ler O Apanhador nos Campos de Centeio . 
Há! Leiam também porque é excelente !


Um jogo, uma ilusão

     Era uma final de campeonato e eu tinha apenas 8 anos . Na noite anterior pedi a Deus que fosse lá ver a partida e abençoasse meu time , pois toda criança cresce escutando que é só pedir a Ele que tudo acontece,né !? Pobre ilusão de uma criança é a de acreditar em quimeras , unicórnios , dragões , ou seja , em fantasias impostas pelos adultos com a finalidade de ludibriar a sua coragem e enaltecer a submissão a eles . 
     No entanto , essa filosofia inspirada em Jean Piaget teve mais sentido naquela manhã . O jogo começou e parece que a estratégia da ilusão daria certo devido ao expressivo resultado, 3x0 . Eu fazia uma ótima partida . Cada passe , drible ou tabela fazia parte de um sonho em que eu só pensava na pureza do meu sorriso e inocência da minha felicidade . Essa última , porém , engana até o ancião mais experiente ou a um mago cuja sua magia floresce aos montes . 
      O começo promissor , a metade decadente e o final fúnebre resumem o que aconteceu , pois a derrota inesperada , fez com que aquela criança lá do começo voltasse para casa com uma ilusão e uma medalha. Não a de campeão que condecoraria toda uma geração . Em casa , olhando para o céu fiquei imaginando o que lá existira e meus olhos se perdiam na escuridão com a promissora resposta de nada . 
       Hoje eu sei que lá existe muita coisa mas aquela resposta , ali , ajudou a quebrar minha ilusão e percebi que não há um Deus , nem monstros e muito menos alguém que atenda nossa fé . Descobri também que essa mesma fé não é uma dádiva de Deus herdada pelo ser humano e sim um direito natural conhecido como razão análogo àquele legitimado pela escola iluminista . Também , descobri que o episódio daquela manha não foi um acontecimento do acaso , mas um ensinamento de que a determinação , luta e esforço do ser humano é a fonte capital de sucesso . Por fim , naquela manhã eu só queria ser puro e continuar a acreditar que o mundo é um sonho , mas até o mais puro é impuro e a vida é feita de impurezas , afinal todos pecamos e esse é o gosto de viver .

Ao som de: Incubus - Love Hearts


Eu sou...


Eu sou….
Eu sou os livros que leio , os lugares que conheço , os vícios que carrego .
Eu sou os erros que cometi , as lições que aprendi , as mágoas que esqueci .
Eu sou os amores que perdi , as decepções que passei , os sonhos que criei .
Eu sou os meus amigos , a minha família , as pessoa que amo .
Eu sou as músicas que escuto , o esporte que prático , a vida que levo .
Eu sou o silêncio , a verdade , a sinceridade profunda .
Eu sou os meus segredos , as minhas atitudes , as minhas lutas .
Eu sou meu passado que assombra na janela
Eu sou meu presente que chora o desrespeito do mundo
Eu sou meu futuro cheio de orgulho e vitórias .
Por fim , eu sou como você me vê . Depende de quando e como me vê passar . É assim que me sinto . Eu tenho um coração . Abra-o e veja-o . Ele é o resumo de tudo que eu sou .